O Portal JWS está publicando todas as entrevistas da coleção de livros “Memória Paranaense”. Aqui está a conversa com Norton Macedo, gravada em 1998. Ele morreu ao 74 anos em 2010.
Nascido em Curitiba, Norton Macedo foi deputado federal por três legislaturas – de 1975 a 1983, pela Aliança Renovadora Nacional (Arena); de 1983 a 1985, pelo Partido Democrático Social (PDS); e pelo Partido da Frente Liberal (PFL), a partir de 1985. Advogado formado pela Universidade Federal do Paraná, Macedo também foi secretário dos governadores Ney Braga, entre 1961 e 1965, e de Pedro Viriato Parigot de Souza, entre 1971 e 1973. Ocupou ainda a presidência do Banco do Estado do Paraná (Banestado), entre os anos de 1994 e 1995.
José Wille – O senhor começou a sua atuação política já como estudante de segundo grau?
Norton Macedo – Sim, já como estudante de segundo grau. Eu tinha, e acho que mantive até hoje, uma certa vocação política. Desde menino, desde os primeiros anos da adolescência, eu já participava de movimentos políticos. Não gosto muito dessas memórias, mas tenho fotografias antigas de inauguração de comitês, de comícios, quando eu tinha 12, 13 anos. Comecei cedo na política. Gostava e gosto de política, e comecei nela, realmente, como presidente da União Paranaense de Estudantes Secundários.
José Wille – Na década de 50, existiam movimentos secundaristas ativos?
Norton Macedo – Na década de 50, existia movimento estudantil. O movimento estudantil, tanto secundarista quanto universitário, era, na época, uma verdadeira escola de política – as assembleias de estudantes, os congressos estudantis de UNE e UPES… Os próprios diretórios acadêmicos e suas assembleias realizavam reuniões que não deixavam nada a dever às grandes reuniões do Congresso Nacional. Então, naquela época, da década de 50 até o início do governo autoritário de 1964, a política estudantil era uma etapa importantíssima para quem quisesse fazer carreira política, para quem quisesse participar da política. Fui presidente da UPES em 1954 e ingressei na faculdade de Direito em seguida, na Universidade do Paraná, e participei das atividades do centro acadêmico Hugo Simas. Fui presidente do Partido Acadêmico Progressista – o partido mais atuante da época na faculdade. Fui conselheiro do centro acadêmico e participava seguidamente de congressos jurídicos estudantis, de congressos nacionais da UNE, e foi aquilo que, segundo penso, mais me firmou, mais me orientou no desejo e na realização de participante da política, como representante do Paraná tantas vezes e em outros cargos da vida pública.
José Wille – A ligação mesmo com a política, como estudante de Direito na universidade, quando surgiu? Como veio a oportunidade de atuar mesmo na política?
Norton Macedo – Além da política estudantil, na época eu já fazia a política partidária. E eu separava as coisas. Na faculdade, era política universitária; fora da faculdade, eu me vinculava à corrente udenista – à UDN, que foi, segundo penso até hoje, o partido político mais autêntico do Brasil. E eu me vinculava àquelas expressões políticas que se identificavam com a UDN, como o governador Bento Munhoz da Rocha, que eu tenho como grande exemplo de parlamentar, como mestre que sempre foi. E o governador Ney Braga, em seguida. Ambos apoiados na sua época – Bento em 1950 e Ney em 1960 – pela UDN, que era o partido com o qual eu mais me identificava.
José Wille – O senhor trabalhou na campanha de Bento Munhoz da Rocha em 1958 para deputado federal.
Norton Macedo – Era um admirador e sou admirador da memória dele, da imagem do que ele foi – um paranaense de primeira linha e um professor do mais alto quilate. A vida dele foi uma lição política, de humanismo, um exemplo de cultura, um dos maiores que o Paraná teve, em toda a sua história.
José Wille – Por que, depois da eleição de Ney, no começo da década de 60, o espaço político se fechou para o ex-governador Bento Munhoz da Rocha? Ele se afastou de Ney Braga, que ele tinha lançado, e depois tentou voltar ao governo do estado e não conseguiu.
Norton Macedo – A política tem desses acidentes, dessas circunstâncias. O Bento foi um líder marcante na história do Paraná. Depois de governador, foi deputado e ministro. Nesse período, no ministério de Café Filho, houve a sua sucessão e os partidos que o apoiaram se dividiram. A UDN lançou o senador Aldo Mader, o PTB lançou o dr. Barros, o PSP lançou o coronel Tourinho. Então, essa divisão do grupo dos partidos integrantes do governo Bento foi o que propiciou o retorno do governador anterior, do PSB. E o grupo político de Bento praticamente se dispersou naquele momento e nunca mais se uniu com a mesma força que tinha na década de 50. O PTB foi para o seu lado, a UDN foi para o seu lado, o próprio Ney, por respeitáveis circunstâncias políticas da época, formou o PDC. E, então, o grupo se dissolveu e, dissolvendo-se, a liderança se prejudica. O professor Bento Munhoz da Rocha conseguiu um mandato de deputado em 1958; depois, candidatou-se a governador e teve à sua disposição a legenda dos seus adversários, mas a maioria de seus companheiros estava já no agrupamento que nasceu em 1960, com a liderança marcante do governador Ney Braga.
José Wille – O senhor participou da campanha de Ney Braga para governo do estado. O que, principalmente, possibilitou a eleição dele?
Norton Macedo – Participei da campanha de 1960 e ela teve uma característica que nenhuma outra campanha teve, pois era uma campanha feita por jovens, jovens que estão aí até hoje, como Richa, Affonso, Zé Augusto Ribeiro, eu próprio, entre tantos outros. Uma campanha que foi marcante para todas as épocas, porque era diferenciada de todas as outras, feita por idealismo. Não havia, na campanha, nenhum funcionário pago. Todo trabalho que houve naquela época – e foi intenso – foi feito espontaneamente, com os objetivos maiores de renovação do Paraná. E quando falo em renovação do Paraná, acho que esse é um fator marcante na eleição de Ney Braga. Claro que houve outros fatores: houve o desgaste do governo na época, que lançou um candidato, o dr. Plínio Costa, um dos grandes nomes paranaenses; houve o prestígio, a força pessoal do senador Souza Naves, que faleceu no ano anterior à eleição e que seria um candidato seríssimo para o governo do estado, substituído por outro bom candidato, o senador Nelson Maculan. Então, com esses fatores todos, o desgaste do governo, a necessidade e a ânsia de renovação, junto à liderança pessoal do Ney, também marcante como comandante pessoal, como líder pessoal, agindo diretamente com o eleitor, fazendo amigos, montando esquemas, somando partidos e correntes em cada município, ele venceu a eleição, com a soma de todos os adversários.
José Wille – O senhor percorreu todos esses municípios, estava junto com ele e, inclusive, era locutor de alguns comícios.
Norton Macedo – Algumas vezes, eu era locutor dos comícios, porque a equipe era muito pequena. Não havia nem muitos veículos – havia o famoso jipe do Padre Aneico, havia a kombi do Miranda Ramos, a kombi do Tomé da Silva… O próprio candidato se deslocava de uma cidade para outra nos carros dos companheiros da cidade de origem. Na cidade seguinte, pegavam outro carro. Era uma campanha feita com amor, com dedicação. Hoje, as campanhas são completamente diferentes. Não creio que se repita no Paraná, agora, uma campanha como aquela. Daí surgiu uma liderança tão marcante que permanece praticamente até os dias de hoje e que teve marcas profundas em todos os governos que se seguiram a ele. De 1960 a 1982, todos os governadores surgiram do primeiro governo Ney Braga. Portanto, foi uma liderança que marcou um largo período na vida do Paraná. Quase meio século do Paraná ficou com a marca do Ney Braga. Claro que houve, depois, divergências entre os companheiros – uns foram para um lado e outros foram para outro, para um partido e para outro. Mas ninguém poderá negar que todos, de 1960 até o fim do governo Richa, foram integrantes da primeira equipe do Ney Braga.
José Wille – O senhor foi convidado para ser o secretário particular do governador Ney Braga. O senhor convivia com ele o dia todo no Palácio?
Norton Macedo – Eu convivia o dia todo, todos os dias. Fui secretário particular dele durante os quatro anos e meio de governo.
José Wille – E era bastante jovem…
Norton Macedo – Bastante jovem. Era a vocação política, que não me separava da atividade política. Primeiro, fui chefe de gabinete da Secretaria de Interior da Justiça, fui secretário particular de Ney Braga no governo e secretário particular de Ney Braga no Ministério da Agricultura. Foram períodos muito ricos da minha vida, períodos que consolidaram em mim uma formação que não pretendo mudar, que eu segui sempre numa linha reta. Não creio que tenha errado muito, não fiz nada na atividade política de que me arrependesse hoje. Tudo isso decorrente da escola de Ney Braga.
José Wille – E o cotidiano de Ney Braga? Como era o ritmo de trabalho nessa fase, no começo da década de 60, quando ele estava, pela primeira vez, no Palácio Iguaçu?
Norton Macedo – Era um ritmo fatigante, porque ele era o primeiro a chegar ao Palácio e o último a sair. Uma atividade intensa, conhecendo profundamente cada setor da atividade governamental. Tinha controle dos seus auxiliares, através até de um aparelho com o qual fazia reuniões de secretariado, ligando diretamente aos secretários do estado. Tecnicamente, não sei definir. Mas era o grande monstro que assustava os auxiliares, porque era a presença do governador ao lado de cada um durante todo o dia. Ele cobrava tudo, ele sabia o andamento de tudo! Ao fim do dia, seguindo o exemplo do grande paranaense que foi Caetano Munhoz da Rocha, ele ligava para o secretário da Fazenda para saber a receita do dia, para saber os acontecimentos da área de arrecadação, tudo, tudo… Tudo sob seu controle pessoal. Essa atividade intensa que ele dedicava a todos os setores evidentemente se refletia muito dentro do Palácio, fazendo com que o trabalho fosse intenso e permanente, mas não desgastante. A gente trabalhava com muita vontade de fazer e realizar alguma coisa e creio que se pode dizer que isso tudo foi feito pelo governo Ney Braga. Realmente, marcou época na vida do Paraná e há quem se refira, embora eu não goste muito desta expressão, ao Paraná antes de Ney Braga e depois de Ney Braga. Não sei se isso é verdadeiro, mas 1960 realmente foi um marco na vida do Paraná.
José Wille – Alguns dizem que o temperamento de Ney Braga era difícil em relação a subordinados, não controle e exigências, mas era conciliador com as pessoas que faziam parte do grupo político, quando buscava apoio pelo interior do Paraná.
Norton Macedo – Era conciliador também com seus companheiros de governo. Ele era e sempre foi um líder expressivo, mas absolutamente civilizado, absolutamente identificado com as pessoas com quem trabalhava. O agrupamento se formava como se fosse realmente um grupo de amigos, trabalhando com o mesmo objetivo. Não havia essas dissidências partidárias. Embora fosse um governo de coligação, os secretários que pertenciam a partidos políticos se vinculavam pessoalmente ao governador, que liderava a execução de um programa administrativo e político que a todos interessava. A candidatura dele nasceu assim, não veio de partidos, embora tenha sido apoiada por partidos. Ela nasceu de lideranças pessoais do Paraná, pois eram muito poucos os municípios na época. Perguntam, às vezes, se a campanha foi uma campanha ideológica, pois, na época, a democracia cristã começava a se destacar em países na Europa. Não! A democracia cristã, o PDC, formou-se na campanha de 1960, com pessoas simples do interior, que não tinham na cabeça ideologia nenhuma, só tinham o anseio de renovar o Paraná, de melhorar a vida pública do Paraná. Então, surgiram em todas as regiões – Paranavaí, Campo Mourão, Sudoeste, Norte Pioneiro – novas lideranças, novas expressões, que nunca tinham participado da política anterior, dos governos anteriores, e criaram um novo agrupamento político, que tinha a participação do PDC, para onde foram esses líderes desvinculados de partidos. E tinha a participação da UDN, já com algumas lideranças definidas anteriormente ao governo Ney, pois o partido tinha deputados expressivos desde 1947. O PDC surgiu praticamente com o Ney, que tinha o apoio de um deputado federal, o Aldo Mader, de alguns deputados estaduais – Agostinho Rodrigues, João Vargas, Padre Aneico, Machado Lima – e de dois prefeitos do Paraná, o Júlio Farah e o Ambrósio Pinto – um, do Norte Pioneiro, e o outro, da Grande Curitiba. Isso demonstra que, com tão poucas lideranças políticas formadas, o que veio com ele foi uma renovação, que se estabeleceu e teve uma continuidade muito longa na história do Paraná.
José Wille – Conhecendo bem Ney Braga e Bento Munhoz da Rocha, que comparativo faz entre eles? E o que levou a permanência de Ney Braga no cenário político por tanto tempo?
Norton Macedo – Se compararmos Munhoz da Rocha e Ney Braga, veremos que são duas personalidades completamente distintas, dois estilos de vida e dois estilos de exercício da vida pública. Bento era fundamentalmente um intelectual. Claro que isso não impede que um intelectual seja um administrador. Ele teve, em seu governo, momentos e obras marcantes. Mas Ney já era mais prático, mais pragmático, mais realizador, e foi isso que marcou efetivamente o seu governo, diferenciando-o de governos anteriores. Com as suas características, foram ambos governadores dos mais expressivos, na época de cada um. O Paraná de Ney Braga passou a ser um Paraná mais moderno, porque a época levava a isso e não porque os governadores passados fossem conservadores ou não fossem progressistas. Eram, mas o Paraná era diferente. O Paraná era muito pobre e – é preciso que se diga, porque é verdade – muito pouco expressivo no âmbito nacional. Em 1960, até pela circunstância de terem sido eleitos na mesma chapa o presidente Jânio Quadros e o governador Ney Braga, o Paraná mudou de feição e começou a fase do desenvolvimento. Criaram-se os instrumentos para o desenvolvimento do Paraná. O BADEP, a Codepar inicial, a Telepar, a Sanepar, tudo isso é criação do governo Ney Braga, porque a época exigia isso. E também exigia a desburocratização da máquina do estado, não só do Paraná, mas dos estados brasileiros. As máquinas da federação eram emperradas. Então, o Ney Braga criou entidades, companhias mistas, fundações, que agilizaram todos os ramos da atividade governamental. Foi essa a marca fundamental do governo Ney Braga. Além disso, evidentemente, houve as grandes obras do governo Ney Braga. Houve a Rodovia do Café, que significou a integração do Paraná. O Norte do Paraná, naquela época, era vinculado e voltado para São Paulo. Com a Rodovia do Café, o Norte veio para o Sul, criando-se realmente um novo Paraná. Sem dúvida nenhuma, a Rodovia do Café foi o ponto marcante do governo Ney Braga, mas houve outros, como a regularização de títulos de terra, a pacificação do Sudoeste, onde a jagunçada tomava conta, os grileiros, que se apropriavam de vastidões imensas do Paraná – e estão até hoje ainda alguns incrustados na vida do Oeste paranaense. A distribuição e legitimação dos títulos de terra no governo Ney Braga foi uma coisa muito mais expressiva naquela época do que toda essa agitação e promessas e programas de reforma agrária que houve ao longo dos últimos anos no Brasil inteiro.
José Wille – O senhor viajava muito com o governador, como seu secretário particular. O estilo dele de fazer política era de se lembrar de quem era filho de quem, que família.. Havia uma organização para isso ou era a sua memória?
Norton Macedo – Era o seu estilo inigualável. Ney se identificava tanto com as pessoas, com os seus líderes regionais e municipais, que os tinha como amigos pessoais. Não havia essa história, que hoje existe em toda a parte, de governador estudando listagens de pessoas na viagem para um município, de quem é quem no município. Não! Aquilo era tudo espontâneo e foi isso, sem dúvida nenhuma, que consolidou o governo de Ney Braga por tanto tempo. Ele conhecia todos pelo nome, entrava na casa de todo mundo, com uma espontaneidade que – eu posso dizer, vivendo tantos anos de política – nunca vi igual.
José Wille – Dentro do governo dele, dois nomes se destacaram: Paulo Pimentel, secretário da Agricultura, e Affonso Camargo, o vice. Os dois esperavam ter preferência à sucessão de Ney Braga. Quando Ney manifestou a preferência por Paulo Pimentel?
Norton Macedo – Não havia só dois nomes. Havia outros que eram falados como possíveis sucessores de Ney Braga. Entre eles, o de Paulo Pimentel e o de Affonso Camargo. O Affonso Camargo trabalhou muito na formação do seu partido, que era o partido do governador, o PDC. Ele era o presidente do partido, o líder do partido, o organizador do partido, o que significava o exercício de uma liderança partidária muito forte. Paulo Pimentel se voltou para uma política mais ampla, não partidária, e teve uma atividade muito intensa na Secretaria da Agricultura. E acabaram sendo os dois homens que se afunilaram em 1965. Evidentemente que o candidato de Ney Braga era Paulo Pimentel. Tão evidente que ele foi à convenção do seu partido defender a candidatura de Paulo Pimentel. E a candidatura de Paulo Pimentel foi vitoriosa na convenção do PDC, por pouca margem de votos, por pouca diferença, contra o dr. Affonso Camargo.
José Wille – Como se explica a escolha de Paulo Pimentel?
Norton Macedo – Ah, isso são circunstâncias da época! Talvez fossem condições eleitorais, talvez fosse facilidade de comunicação, talvez fosse mais presença no interior, através de uma atividade muito bem exercida.
José Wille – Ney tinha preocupação de seu candidato enfrentar Bento Munhoz da Rocha, que tentaria voltar ao governo?
Norton Macedo – Não! Ele não estava com essa preocupação.
José Wille – …Mas ele buscava por um nome que pudesse fazer frente….
Norton Macedo – Não, ele não tinha essa preocupação! A candidatura do Bento Munhoz da Rocha surgiu depois de lançada a candidatura de Paulo Pimentel. É o que eu disse para você: a origem de Bento e a de Ney eram a mesma. Acontece que, na sucessão de Ney Braga, ambos já estavam pessoalmente afastados há alguns anos. O professor Munhoz da Rocha teve ao seu lado, na campanha de 1965, praticamente os adversários seus da década de 50. O governo não estava preocupado com a candidatura de Bento Munhoz da Rocha, porque ela surgiu depois da candidatura de Paulo Pimentel. Foi uma campanha duríssima, exatamente pelo valor do candidato que as oposições lançaram contra Paulo Pimentel.
José Wille – Como foi a real participação do ex-governador Ney Braga no golpe militar de março de 1964? Há quem diga que ele, na verdade, não teria interesse em uma participação muita ativa na conspiração, porque no cargo tinha dependência do governo federal, de João Goulart, que estava na presidência. Outros dizem que ele foi atuante na mobilização aqui do Paraná.
Norton Macedo – A gente tenta ver isso sob vários aspectos. A formação do Ney era militar. E o grupo militar era o que, na época, participava de eleições polêmicas, com a chapa azul contra a chapa amarela, que era dos oficiais de uma linha mais esquerdista. Então, a origem militar do Ney Braga fazia com que ele se identificasse com o grupo que fez a Revolução de 1964. Ele era governador e o Paraná precisava – como precisa – do governo federal. Então, ele não hostilizou e não foi hostilizado pelo governo João Goulart. Dentro da órbita administrativa, tinha o melhor diálogo possível com o governo da República. Até porque o presidente era um homem de formação muito humana, um homem simples, que não tinha dificuldades de diálogo, mesmo com os seus adversários. Ney nunca participou do esquema João Goulart. O governo do Paraná vinculava-se ao governo da República. Mas, quando o professor Carvalho Pinto deixou o Ministério da Fazenda, em novembro ou dezembro de 1963, aquilo funcionou como um sinal para os governadores antigovernistas na área federal – Magalhães Pinto, Lacerda, Ney Braga, Ademar de Barros… E esses homens se articularam ao mesmo tempo que o Exército na corrente que levou ao movimento de 31 de março, ao qual chegou às vésperas da Revolução com o apoio definitivo de Castelo Branco. O presidente Castelo Branco não foi um revolucionário, um conspirador. Conspiradores foram os amigos, o seu grupo – Ernesto Geisel, marechal Queiroz, marechal Farias e tantos outros. Esses homens tinham vínculos pessoais com o governador Ney Braga, vínculos de amizade pessoal. O general Geisel comandou a Quinta Região Militar no tempo em que Ney era governador e, naquele período, ambos conversavam e, muito evidentemente, sobre a situação brasileira, o que todos sabem – e os que não sabem, devem procurar saber – foi se deteriorando durante o governo João Goulart, até chegar ao inevitável movimento militar de 31 de março, que teve, sem dúvida nenhuma, um grande apoio popular em todo o Brasil.
José Wille – E houve participação prévia do governador Ney Braga no movimento militar? Ele participava das reuniões?
Norton Macedo – Ele tinha contatos, tinha conversações, participava de reuniões, mas o aceleramento da Revolução veio exatamente em 1964. Havia as correntes que se posicionavam, havia a coordenação do general Golbery de um lado; de outro lado, do marechal Queiroz; do outro, do general Geisel. Mas todas eram mais ou menos paralelas, não havia um centro. O centro surgiu exatamente no início de 1964, com os atuantes – todos com quem se vinculara Ney Braga ao longo de sua carreira militar.
José Wille – Como foi a atividade neste dia no Palácio Iguaçu?
Norton Macedo – Claro que foi intensa, claro que foi preocupante! Chegamos até, na mesma madrugada de 31 de março, com os generais Oswaldo Cordeiro Farias e Nelson Melo aqui em Curitiba, a ter notícias de posições dúbias de algumas autoridades militares. E o governo foi levado a convocar para o Palácio todos os seus amigos, todos os integrantes do governo. Houve realmente uma manifestação na madrugada de 31 de março como nunca houvera no palácio do governo até então. Foi um movimento muito intenso! Ney Braga, dois ou três dias antes, esteve em Minas Gerais, já praticamente durante a deflagração do movimento, em reunião com o governador Magalhães Pinto e com os generais Guedes e Mourão. Tinha contatos frequentes, e era eu quem estava ao lado do seu telefone, com o governador Carlos Lacerda e com muitas outras lideranças militares – principalmente, já nesses dias, com o marechal Humberto Castelo Branco, cuja residência em Ipanema passou a ser o centro da conspiração e da efetivação do movimento militar, a deflagração do movimento militar em termos nacionais.
José Wille – Dentro do governo, havia a preocupação de colocar barreiras nos aeroportos paranaenses. Por quê?
Norton Macedo – Houve isso! Todos os aeroportos do Paraná, inclusive os pequenos aeroportos, absolutamente insignificantes, que não constavam dos mapas da Aeronáutica, foram interditados, exatamente porque os titulares dos comandos militares do Sul, do Terceiro Exército e da Quinta Região Militar não estavam nos seus postos. Um não tinha assumido, o outro estava licenciado. O agrupamento militar que comandava o movimento revolucionário tentou, com isso, evitar que esses generais que haviam embarcado no Rio de Janeiro rumo a seus postos descessem no Paraná ou no Rio Grande do Sul, onde houve também essa movimentação. No Paraná, foram interditados todos os aeroportos e essa operação foi comandada pelo secretário de Segurança em exercício, o general Gaspar Peixoto Costa.
José Wille – Como foi a vitória do movimento militar? E como foi a atuação do governo do estado em relação à oposição que existia aqui, às pessoas ligadas à esquerda?
Norton Macedo – As vinculações do governador com a nova situação eram as mais íntimas possíveis. O Paraná passou a ser representado no governo federal por vários postos – Ministério da Educação, presidência do IBC… Na oposição, o quadro era diferente no Paraná, porque o PTB, que integrava o governo federal, também integrava o governo estadual. Desde 1962, havia o acordo PTB, UDN, PDC e outros partidos menores. Portanto, não houve nada de estranho, nada de pesado, nada de rigoroso e fora das normas do que o governo tinha traçado para si. Com relação à esquerda, por exemplo, com todo respeito a todos os esquerdistas, pois não há por que discriminá-los, ela nunca foi muito expressiva no Paraná, como até hoje não é, e a atuação do governo foi absolutamente tranquila. Não tenho notícia nenhuma – e vivia o dia a dia do governo – de perseguição política. Nenhuma das cassações que houve teve a participação do governo do estado ou a participação pessoal do governador Ney Braga. Foram problemas surgidos na área militar, no sentido nacional para cá, nada daqui para lá. Até como testemunhos disso, há livros publicados sobre a época, um deles de um jornalista paranaense sobre a repressão no Paraná. Esse livro, que poderia ser uma denúncia de violências do governo do estado, praticamente é um atestado do bom comportamento do governo da época. O livro não aponta nada de concreto, sério, que levasse a esse posicionamento extremado do governo com relação a correntes oposicionistas ou correntes de esquerda. Houve uma perfeita harmonia do Paraná com o seu governo e não houve nada que pudesse manchar o comportamento democrático do governo Ney Braga.
José Wille – Depois veio a eleição de Paulo Pimentel, que era apoiado por Ney Braga. Aí, Ney Braga foi para o Ministério da Agricultura. O senhor acompanhou o ex-governador?
Norton Macedo – Exatamente. Ele ficou no Ministério da Agricultura por nove meses, um período rápido durante o governo do Castelo Branco, porque houve necessidade de desencompatibilização do ministro Ney Braga para concorrer ao Senado. O Ministério da Agricultura foi uma atividade muito atraente, muito gratificante para ele, porque vinha de um estado agrícola. E era a primeira vez que o Paraná, nos novos tempos, no tempo revolucionário, tinha participação direta no comando e na orientação da área agrícola. Ney Braga marcou a sua atuação pela criação do fundo de garantia, da lei do cooperativismo, da lei de reflorestamento. Pequeno período, mas muito produtivo no traçado de novas políticas dos setores vinculados à agricultura brasileira.
José Wille – E aí veio a sua participação na campanha de Ney para o Senado. Deste momento em diante, o senhor se afastou um tempo da política e foi para a iniciativa privada.
Norton Macedo – Sim. Participei da campanha de Ney para o Senado, mas foi uma campanha muito fácil. A campanha de 1966 tinha Ney Braga como candidato ao Senado e mais dois candidatos e sublegendas do PMDB, que eram novamente o senador Maculan, seu adversário em 1960, e o dr. Affonso Camargo, sublegenda do PMDB. Ney Braga fez 66% dos votos paranaenses, contra 33% da soma dos outros dois. Portanto, foi uma campanha muito fácil.
José Wille – E veio, nesta época, a ruptura política entre Ney Braga e Paulo Pimentel.
Norton Macedo – Paulo Pimentel e Ney Braga se afastaram – e, hoje, dou um testemunho absolutamente isento, de cabeça fria – mais por divergências dos segundos escalões de cada um. Ambos, pessoalmente, não tinham motivos sérios para divergências, para separação. Tanto que, depois, uniram-se em outras campanhas. Realmente havia uma pressão de um grupo, os desejos de outro grupo não atendidos, e isso criou choques, sem dúvida nenhuma. E houve o afastamento das principais figuras vinculadas a Ney Braga e ao governo do dr. Paulo Pimentel, que eram Saul Raiz, Guilherme Braga… Mas não foram divergências tão fundas que prejudicassem o reencontro e o trabalho comum em muitas oportunidades da política paranaense.
José Wille – Em 1974, depois de sete anos afastado, o senhor voltou à política e saiu em campanha para deputado federal. Foi uma eleição difícil, pois foi quando o MDB teve um grande crescimento, projetou-se e elegeu muita gente aqui no Paraná.
Norton Macedo – Foi aquela surpresa nacional as 16 derrotas da Arena, que perdeu as eleições para o Senado em 16 estados, inclusive no Paraná, embora tivesse um excelente candidato, que era o deputado João Mansur. Mas é aquela história que não deve haver em política: considerava-se a eleição ganha. E, considerando-se a eleição ganha, o trabalho não foi tão intenso como deveria ter sido. Não posso dizer que tenha sido uma campanha difícil para mim, porque foi a primeira eleição que disputei e fiz 85 mil votos, sendo que, na época, fui o segundo mais votado no estado. Realmente, ali comecei minha atividade política pessoal, mas sempre vinculado ao grupo Ney Braga e a ele, principalmente. Mas fiz meu mandato com absoluta independência, muitas vezes até acusado de rebeldia, porque eu não era deputado de dizer “sim, senhor” o tempo inteiro. Não adiantava muito ser independente, porque as instituições eram muito concentradas nas mãos do Poder Executivo e o Congresso tinha um papel muito fraco na vida nacional. E digo que – em um depoimento até com certa tristeza – a cada legislatura de que eu participava, de uma para outra, esperava-se que a próxima fosse melhor, mas acontecia exatamente o contrário. As legislaturas que se seguiam, em termos de valores pessoais, em termos de talento, em termos de liderança política, eram cada vez menos expressivas e – não estou mais bem informado da política partidária – parece que esse episódio tem se repetido nas eleições de 1986, 1990 e 1994. As bancadas no Brasil, infelizmente, não têm melhorado e o Congresso não tem se afirmado como poder, a tal ponto que aquilo que mais se ouve e mais se vê no Congresso Nacional são atitudes que colaboram para desmoralizar o Poder Legislativo. Quando se veem esses casos de Paulinho, Pedrinho, Abrão, Marquinhos, Sérgio Naya e cassações e votos de pianistas, isso tudo contribui para fazer com que o Congresso, cada vez mais, seja desacreditado perante a opinião pública, o que, seguramente, não é conveniente para a democracia brasileira.
José Wille – Quando o senhor se elegeu, em 1974, houve uma fase de grande presença paranaense em Brasília. Ney Braga se dava bem com o general Geisel e conseguia, então, aquilo que o Paraná esperava. Que recordações o senhor guarda, como deputado federal e nos cargos que exerceu, como presidente do partido do governo, que era o PDS, e como vice-líder da Câmara?
Norton Macedo – Foram papéis e cargos importantes, claro, mas cada presidente tem a sua característica pessoal. O presidente Geisel era um homem muito fechado. E foi sempre, até a morte, um homem muito fechado. Claro que o Paraná tinha uma presença muito grande, através do ministro da Educação, que era o Ney Braga. Durante todo o governo Ney Braga, o Ministério da Educação foi ocupado por ele e, depois, rapidamente, por outro paranaense, o professor Euro Brandão. Mas a atividade política junto ao governo era muito difícil, porque o governo era muito personalista, muito dono da verdade, porque essa era a formação do presidente Ernesto Geisel. Depois, já na minha legislatura seguinte, veio o governo de um presidente que pediu para ser esquecido. E eu até prefiro atender à sua vontade, porque, se eu tivesse que dar um depoimento sobre o período dele, o período em que convivemos com ele, com esse governo no Parlamento, isto seria muito desagradável. Realmente, o Paraná, naquele período, foi muito prejudicado, porque o presidente da época, por alguma razão, tinha uma diferença pessoal com o governador Ney Braga, que devia vir dos tempos do Realengo, pois os dois foram membros da mesma turma de 1937. Só o que posso dizer é que Figueiredo não foi um presidente que tenha favorecido o Paraná em nenhum momento do seu longo mandato.
José Wille – O processo de escolha de João Figueiredo foi uma decisão pessoal do presidente Geisel?
Norton Macedo – Acho que sim! Lamentavelmente, acho que esse foi o grande erro do presidente Geisel, pois ele conhecia o general Figueiredo de convívio de caserna e convívio de governos. Ele era o chefe do SNI do estado da Guanabara e, depois, foi chefe da Casa Militar e chefe nacional do SNI. Portanto, o presidente Geisel tinha obrigação de conhecê-lo e não poderia nunca indicá-lo para presidente da República. Mas o indicou, uma indicação única e pessoal. Não houve fatores externos conhecidos que levassem a uma informação de que o presidente tenha cedido a pressões de grupos, Forças Armadas ou outros comandos. Foi uma escolha pessoal, infeliz. O pecado capital do presidente Geisel, sem dúvida, foi a escolha de seu sucessor.
José Wille – O senhor tinha um cargo de liderança no Congresso, tinha que estar presente, falando com o presidente, mas era difícil essa conversa?
Norton Macedo – Era difícil, até porque ele não governava. Ele delegava – em um período, era o general Golbery; depois, em outro período, o ministro Leitão de Abreu; em outra área, o ministro Delfim Neto… Então, era muito difícil, pois ele não tinha diálogo com político, não só com político paranaense. O conceito político dele era, dentro do Congresso, o pior possível. Deve ter sido o pior de todos os presidentes que o Brasil teve.
José Wille – O senhor estava ainda na presidência do partido do governo do presidente João Figueiredo, o PDS. E tinha posição favorável às eleições diretas, o que contrariava o presidente. Como foi comunicar isso ao presidente?
Norton Macedo – Realmente, eu era presidente do PDS e votei pelas eleições diretas. Mas era uma posição que eu tinha, uma formação. Eu era favorável ao princípio da eleição direta e ninguém me tiraria dela. O presidente até, talvez por me conhecer pouco, convocou-me para uma audiência, mas, evidentemente, meu voto pelas eleições diretas permaneceu o mesmo e eu o repetiria em quaisquer circunstâncias. O presidente mesmo, alguns dias antes na África, havia se declarado a favor das eleições diretas, mas, depois, voltou atrás. Mas eu tinha uma posição definida, uma posição de formação, e essa comunicação fiz pessoalmente ao presidente, que, evidentemente, não a recebeu bem.
José Wille – O senhor falou dos articuladores do início da formação do PFL, que surgiu como dissidência dentro do PDS, o partido do governo federal. Houve pressão do governo para tentar evitar essa divisão?
Norton Macedo – O processo se iniciou exatamente com a votação das eleições diretas, com 30 ou 40 deputados do PDS se rebelando. Desses deputados, exatamente 23 foram os formadores, os signatários da formação da Frente Liberal, que se destinava a lançar a candidatura do vice-presidente Aureliano Chaves à presidência da República. Formou-se a Frente Liberal e inviabilizou-se, até por veto do presidente na época, a candidatura de Chaves pelo PDS. Figueiredo tentou fazer o coronel Mauro Andreazza candidato a presidente pelo PDS e também não conseguiu, porque foi escolhido o dr. Paulo Maluf. Formamos a Frente Liberal, liderada pelo dr. Aureliano Chaves, e participamos do lançamento da candidatura para presidência do Tancredo Neves. É preciso que se diga que o Tancredo Neves só renunciou ao governo de Minas depois de conhecer os 23 integrantes da Frente Liberal e ter a convicção de que aqueles eram votos suficientes para mudar o quórum do colégio eleitoral em favor de sua candidatura. Então, assim que se formou a Frente Liberal, infelizmente, os fatos mudaram os caminhos da história do Brasil. O presidente Tancredo Neves, que era um estadista incomparável, não chegou a assumir a presidência. Assumiu o presidente Sarney, que, a meu ver, exerceu a presidência com muita compostura e dignidade. Fez um governo sério, mas é claro que houve pontos fracos, pois não há governo que não os tenha, mas o saldo do governo dele foi muito positivo. Ele era um homem de formação democrática, ajudou a consolidar o processo de abertura que já estava instalado e, sem dúvida nenhuma, teve uma gestão que não pecou nos grandes pontos políticos e administrativos. Tanto que se elegeu senador e tem uma presença marcante na vida política brasileira.
José Wille – Dos doze anos em que o senhor foi deputado federal em Brasília, o governo Sarney, deve ter sido a fase de maior participação política, depois de dois governos militares.
Norton Macedo – Sem dúvida nenhuma! O presidente Sarney era de uma atenção extremada com os parlamentares, atenção pessoal e atenção política. Você mesmo salientou que fui presidente e vice-líder do partido, mas, mesmo depois de ter deixado o exercício do mandato, várias vezes fui convidado pelo presidente Sarney para jantar no Palácio da Alvorada, o que nunca teria acontecido nos governos anteriores, que eram absolutamente fechados à classe política. O presidente Sarney, neste aspecto, foi altamente democrático, altamente civilizado, dando ao Parlamento o valor que deveria ter e não tinha. A partir de então, os fatos estão aí. Encerrado o governo Sarney, houve aquela catástrofe brasileira. Depois, uma outra catástrofe menos brilhante, que foi o Itamar Franco. E agora estamos nesse novo período da vida nacional, no qual o presidente Fernando Henrique Cardoso realiza um governo que, ao que se sente, atende aos interesses da nação.
José Wille – Em 1987, o senhor se afastou definitivamente da política?
Norton Macedo – Eu me afastei da política, me desliguei dos partidos políticos. Mas, depois de sete anos, fui convocado pelo governador Mario Pereira, com quem tinha relacionamento muito distante, não éramos amigos íntimos, para presidente do Banco do Estado do Paraná. E eu aceitei, com muita honra, embora fosse por um pequeno período, porque, para um político que já tinha decidido encerrar a sua carreira, é bom e confortante vê-la encerrada exatamente pelas mãos daqueles a quem fez oposição durante todo o exercício da sua vida política. Nunca tive vinculações maiores com o PMDB – e o governador Mario Pereira era do PMDB – e me escolheu para presidente do Banco do Estado, uma função de grande relevância, de capital importância no estado – exatamente a um homem que não tinha com ele vínculos políticos, o que permitiu, desde aquela época – não sei se depois – afastar o Banco do Estado de interesses políticos. Eu passei nove meses no Banco do Estado sem ter, em momento nenhum, a interferência de qualquer político na atividade do banco. Havia muitas acusações de que o banco era influenciado por políticos, que atendia ao interesse dos deputados… No meu tempo – e digo isso de cabeça absolutamente fria, com tranquilidade de consciência – o banco, por decisão do governador e por decisão prática do seu presidente, não teve a menor ingerência política e não teve naquele período eleitoral nenhuma participação em favor dos interesses desta ou daquela corrente. Foi, para mim, a presidência do Banco do Estado um bom fim de carreira política.
José Wille – De todo o tempo que o senhor esteve na carreira política, desde a década de 50, participando de comícios, de campanhas, o que mudou na política, na forma de fazer política, na forma de se eleger?
Norton Macedo – Mudou tudo! A política era feita com idealismo. Hoje, a política, claro que com as exceções de praxe, é um balcão comercial. Hoje, o voto é comprado, a eleição é dirigida. Hoje, a eleição é feita por pesquisas, que não se sabe como são feitas, pesquisas que, embora não decidam pelo eleitor, influem no eleitorado de uma forma preponderante. Então, aquela política do contato pessoal, da amizade pessoal, das mãos dadas, de trabalho conjunto, essa política não existe mais. Hoje, cada eleição é um leilão, que elege muitas vezes pessoas da melhor categoria, mas, infelizmente, pessoas que não estão à altura dos mandatos que recebem.
José Wille – O contato antigo com o eleitor, o comício em cada uma das cidades – foi substituído pela televisão. A partir de 1974, isso ficou muito claro na campanha em que foi vitorioso o PMDB. Isso mudou também a forma de fazer política.
Norton Macedo – Mudou, claro! A comunicação se tornou mais fácil. O rádio já tinha uma influência muito grande no processo eleitoral. A televisão aumentou a presença dos candidatos perante o eleitor e também, de certa forma, tornou dispensáveis os comícios –aqueles belos comícios, que eram o contato direto do candidato com o eleitor e que hoje são muito raros. Hoje, a comunicação é pela televisão, pelo rádio, e os contatos pessoais diminuíram muito, de tal forma que a gente sente muito pelos companheiros do interior – eu os tenho em muito apreço – que sentem falta da presença dos candidatos. Os candidatos, hoje, chegam através dos meios eletrônicos. Não há mais o aperto de mão, o abraço… A eleição mudou completamente, mas mudou, principalmente, no aspecto de se tornar um leilão não muito recomendável para o aperfeiçoamento político democrático do país.
José Wille – Finalizando: sobre a pouca representatividade paranaense no Congresso. Há o consenso de que o Paraná poderia, ao longo de sua história, ter uma presença maior.
Norton Macedo – Concordo! Concordo e lamento. Agora, cabe ao povo escolher bem, selecionar melhor, e isso depende exclusivamente do voto popular. Claro que há essas influências laterais, de que já falamos, mas, na cabine, é o voto que vale. Se as representações estão piorando – e, de certa forma, estão piorando – há grande participação popular em tudo isso.